UFSC monitora população de peixes do Rio Uruguai

20 de maio de 2025

Em 2025, o Laboratório de Biologia e Cultivo de Peixes de Água Doce (Lapad) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) completará três décadas de monitoramento da ictiofauna, ou seja, das espécies de peixes do alto Rio Uruguai, na divisa de Santa Catarina com o Rio Grande do Sul.

 

Os trabalhos começaram em 1995, mas se intensificaram a partir do ano 2000, quando entrou em operação a Usina Hidrelétrica (UHE) Itá, situada entre os municípios de Itá, no Oeste catarinense, e Aratiba, no Norte gaúcho. Financiado pelo Consórcio Itá e pela Engie Brasil Energia, a iniciativa conta com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa e Extensão Universitária (Fapeu). “A Fapeu é responsável pelo gerenciamento administrativo e financeiro do projeto, atividades fundamentais que propiciam agilidade e eficiência às atividades desenvolvidas pelo Lapad”, observa Alex Pires de Oliveira Nuñer, coordenador do projeto.

 

Há quase 30 anos, o Lapad pesquisa, maneja e desenvolve tecnologias ligadas à ictiofauna da região. No período foram realizadas diversas ações integradas, como a avaliação da produção pesqueira através da análise da pesca artesanal; o desenvolvimento de tecnologias para cultivo de espécies nativas de peixes; a manutenção de um plantel de reprodutores de peixes; a estocagem experimental de espécies migradoras de peixes para garantir a recomposição dos estoques pesqueiros; e a criação e a manutenção de um banco de sêmen crioconservado. “É através do monitoramento da ictiofauna que são identificadas possíveis alterações nos indicadores ecológicos da comunidade de peixes e nos ovos e larvas de peixes, o ictioplâncton”, explica o professor Alex Nuñer.

 

O trabalho é necessário porque a implantação e operação de empreendimentos hidrelétricos produzem modificações nos habitats, na dinâmica e na estrutura das comunidades de peixes. “Essas modificações limitam a continuidade de algumas espécies no ambiente e favorecem a proliferação de outras, de modo que o monitoramento contínuo dessas alterações é parte fundamental das ações de mitigação dos impactos produzidos”, observa o professor.

 

A eficácia das estocagens experimentais de peixes é realizada juntamente com os pescadores artesanais parceiros do projeto, que armazenam em álcool um pequeno pedaço das nadadeiras das espécies migradoras por eles capturadas para posterior análise. Através da caracterização dos peixes capturados no rio é possível realizar a análise de parentesco para descobrir se os peixes capturados são oriundos dos programas de estocagens experimentais do Lapad.

 

No monitoramento, apetrechos de pesca são instalados em ambientes distintos dos rios para captura e análise dos indivíduos presentes, e identificação da dinâmica de possíveis alterações das espécies. “Os estudos do ictioplâncton possibilitaram identificar locais importantes para a desova e crescimento, e padrões reprodutivos de espécies migradoras”, salienta o coordenador dos trabalhos. Nesses estudos foram catalogadas informações sobre 114 espécies de peixes na região, que foram compiladas na publicação do Catálogo Ilustrado dos Peixes do Alto Rio Uruguai, publicado em 2004 pela Editora da UFSC/Tractebel Energia, que se encontra em fase edição revisada e ampliada.

 

O monitoramento da ictiofauna é complementado com dados da pesca artesanal, obtidos em parceria com pescadores artesanais que atuam na área do reservatório da usina de Itá. “A colaboração voluntária contribui para a avaliação contínua da produção pesqueira local, ampliando assim os dados sobre quais espécies são mais capturadas, em que período e com qual apetrecho de pesca”, destaca o professor.

 

REPRODUÇÃO

 

Como parte do trabalho de conservação, bem como para incentivar a produção de espécies nativas de peixes, o Lapad também desenvolve tecnologias de reprodução e cultivo de alevinos das espécies migradoras. “Essas são as espécies mais afetadas pelos barramentos dos rios, que impedem o seu processo natural de reprodução”, observa Nuñer. Os peixes do plantel de reprodutores, que possuem carga genética exclusiva da bacia do Rio Uruguai, estão estocados na Estação Experimental de Piscicultura da UFSC, e são submetidos a protocolos experimentais de reprodução induzida para a produção de alevinos em grande escala.

 

Atualmente estão estocados para reprodução exemplares de dourado (Salminus brasiliensis), piracanjuba (Brycon orbignyanus), piava (Megaleporinus obtusidens), curimbatá (Prochilodus lineatus), suruvi (Steindachneridion scriptum) e mandi-amarelo (Pimelodus  maculatus), espécies migradoras consideradas de populações vulneráveis ou que sofrem algum tipo de pressão ambiental. “Todos os reprodutores são caracterizados geneticamente, e recebem uma etiqueta eletrônica (pit-tag), o que possibilita a identificação precisa dos animais”, explica o coordenador do projeto.

 

 

DIVERSIDADE

 

O Lapad realiza as estocagens experimentais com fins de reprodução desde 2004. O laboratório coleta reprodutores no Rio Uruguai, faz a caracterização genética e promove cruzamentos controlados a fim de maximizar a variabilidade genética. “Essa etapa é fundamental para evitar o acasalamento de peixes com carga genética muito parecida, por exemplo, como a reprodução entre irmãos ou entre pais e filhos. Isso porque, quando são realizados cruzamentos entre indivíduos aparentados, reduz-se a variabilidade genética, aumentando as chances de enfraquecimento da população”, comenta o professor.

 

Os estudos de investigação da diversidade genética dos peixes no Rio Uruguai começaram em 2006. Desde então, diversas ações têm sido realizadas, principalmente com as espécies migradoras, como dourado e o suruvi. “Os trabalhos investigam a diversidade e a estrutura genética das populações com o objetivo de conhecer como as atividades provocadas pelo homem estão afetando a carga genética das espécies mais impactadas por essas mudanças”, explica o coordenador.

 

A eficácia das estocagens experimentais de peixes é realizada juntamente com os pescadores artesanais parceiros do projeto, que armazenam em álcool um pequeno pedaço das nadadeiras das espécies migradoras por eles capturadas para posterior análise. Através da caracterização dos peixes capturados no rio é possível realizar a análise de parentesco para descobrir se os peixes capturados são oriundos dos programas de estocagens experimentais do Lapad.

 

CRIOPRESERVAÇÃO

 

A criopreservação de sêmen de peixe, ou seja, o congelamento de sêmen para preservação do material, também é realizada pelo Lapad para conservação da variabilidade genética a longo prazo. A prática, da mesma forma, é adotada para o caso de necessidade de reestabelecimento das populações naturais. Para tanto, o sêmen congelado é mantido em contêineres de nitrogênio líquido a -196ºC.

“As ações desenvolvidas neste projeto, que objetivam a conservação e o manejo das espécies em seu ambiente, são de extrema importância para o meio ambiente e para a sociedade em geral, pois os peixes são atores de grande importância ambiental por realizar diversos serviços ecossistêmicos”, define o coordenador dos trabalhos.

Além disso, as ações também fazem bem para a formação acadêmica. Afinal, ao longo das últimas três décadas, mais de 150 alunos, entre graduação, mestrado, doutorado e pós-doutorado, estiveram envolvidos direta ou indiretamente nos estudos.

 

PROJETO: MONITORAMENTO E MANEJO DA ICTIOFAUNA DA UHE ITÁ / COORDENADOR: Alex Pires de Oliveira Nuñer / alex.nuner@ufsc.br lapad.cca@contato.ufsc.br / UFSC / Departamento de Aquicultura / CCA / 23 participantes

 

Fotos Divulgação/Lapad

 

* Esta reportagem faz parte da edição 15 da Revista da Fapeu que está disponível na íntegra para download em https://tinyurl.com/RevistaDaFapeu